Radialista António Sérgio completa 40 anos de carreira dedicados à música alternativa. Neste momento assina "Viriato 25" na Radar, mas podemos ouvi-lo com voz-off da SIC
António Sérgio é um dos senhores da rádio. Com 58 anos, 40 passou-os a trabalhar para a sua "dama". Pioneiro dos programas de autor, é um "baluarte da resistência" na divulgação da música alternativa.
Começou na Renascença, ajudou a construir a XFM, e depois de largos anos na rádio Comercial, onde manteve o mítico "A hora do lobo", o radialista viu-se impelido a mudar de casa, tendo sido acolhido na Radar, onde assina "Viriato 25". O também voz off da SIC, quando vai de férias, curiosamente, não leva CDs no carro, sujeitando-se "a música atroz", como refere.
Que balanço faz destes 40 anos de carreira?Naturalmente bom, mas também só faço esse balanço positivo porque ainda estou em actividade, se não estivesse, o meu lado pessimista iria toldar-me a resposta. Comecei com 18 anos na rádio, em 1968, em tarefas muito vulgares, aquilo que nós chamamos trabalho de continuidade. No entanto, o meu sonho concretizou-se desde que comecei a dominar um bocadinho a rádio em si, sobretudo a parte que para mim é muito filosófica, que é a rádio entrar dentro de nós. Desde então, a rádio passou a ser a primeira dama, a par da música, talvez até elas se confundam. Mas passou a ser uma necessidade quase catártica, trabalhar.
António Sérgio é um dos senhores da rádio. Com 58 anos, 40 passou-os a trabalhar para a sua "dama". Pioneiro dos programas de autor, é um "baluarte da resistência" na divulgação da música alternativa.
Começou na Renascença, ajudou a construir a XFM, e depois de largos anos na rádio Comercial, onde manteve o mítico "A hora do lobo", o radialista viu-se impelido a mudar de casa, tendo sido acolhido na Radar, onde assina "Viriato 25". O também voz off da SIC, quando vai de férias, curiosamente, não leva CDs no carro, sujeitando-se "a música atroz", como refere.
Que balanço faz destes 40 anos de carreira?Naturalmente bom, mas também só faço esse balanço positivo porque ainda estou em actividade, se não estivesse, o meu lado pessimista iria toldar-me a resposta. Comecei com 18 anos na rádio, em 1968, em tarefas muito vulgares, aquilo que nós chamamos trabalho de continuidade. No entanto, o meu sonho concretizou-se desde que comecei a dominar um bocadinho a rádio em si, sobretudo a parte que para mim é muito filosófica, que é a rádio entrar dentro de nós. Desde então, a rádio passou a ser a primeira dama, a par da música, talvez até elas se confundam. Mas passou a ser uma necessidade quase catártica, trabalhar.
Sempre a lutar pelo direito à diferença?
Sim. Tinha colegas que ainda hoje respeito muito, mas que olhavam para mim de soslaio. Havia um fenómeno de música que soava um bocado duro, em que os músicos não eram grandes executantes, mas a mensagem que esse punk/rock trazia era fundamental escoá-la e dar-lhe passagem. Nessas alturas foi preciso mesmo lutar um bocadinho, ou aguentar essa espécie de ostracismo que senti e que acaba por se verificar nos meus horários durante 40 anos: 80 a 90% são nocturnos. Hoje a escolha está limitada ou à Antena 3, da rádio nacional, e depois a estas pequenas, como é o caso de uma Radar, ou Oxigénio, que tentam alimentar as minorias e nichos de gosto e de mercado. As playlists são geriátricas, não é que não seja agradável ouvir uma vez, mas o leque de oferta está fechado com um elástico. O que se ouve a uma determinada hora hoje, com uma variação de uns minutos, é o que se vai ouvir amanhã. É uma sensação de mecanismo roto. Tem pilha estragada.
O Maio de 68 tem um simbolismo especial para si?
Tem bastante, é uma data coincidente com os meus 18 anos e com o início da carreira na rádio. Em 68, já tinha um substracto cultural importante. Para mim já não foi surpresa, alguns já conversávamos sobre isso e sobre a necessidade de haver um empurrão na Europa em certas situações de injustiça social, mas o curioso é que pensávamos que era através do grande urso russo que ia acontecer alguma coisa e não a partir de França, pese embora fosse um país com um tecido democrático propenso a essas coisas. Lembro de se falar que o Maio de 68 era um passo muito perigoso para a eclosão de um terrorismo urbano, tempos mais tarde vem a verificar-se esse mesmo terrorismo a florescer. Foram casos que se agudizaram em Israel e na Faixa de Gaza. Aqui, com a censura e o sistema pidesco, não sentimos tanto, mas o Maio de 68 foi uma bela mostra de como uma ideologia pode obrigar a mudanças sociais.
É muito diferente trabalhar num Portugal subordinado à ditadura...
Muito diferente. Aliás, como cidadão primeiro de tudo, só o facto de poder votar, significou imenso, coisa que nunca mais deixei de fazer e discuto sempre com quem não vota. O voto é a nossa arma mais directa. De resto, eu estava na tropa no 25 de Abril, e vivi a Revolução muito de perto. Quanto mais depressa acabarem as ditaduras e os poderes oligárquicos, muitos deles mascarados, que ainda há por aí, melhor.
Consegue eleger o ponto mais alto e o mais baixo da sua carreira?
Mais alto, facilmente. Aqueles quatro anos, de 93 a 97 na XFM onde tive o programa matinal "O primeiro delta". Foi a primeira vez que me senti a trabalhar verdadeiramente em equipa e a ajudar a criar uma rádio de raíz. Tive de ser eu próprio a exercer uma auto-censura e esse exercício fez-me bem à parte da humildade, que não se sabe bem como mas reforça a auto-estima. O ponto mais baixo foi a maneira como saí da Rádio Comercial o ano passado. Agora já nem guardo mágoa, pois comecei logo a trabalhar na Radar e isso é o melhor remédio. Não gostei foi das relações humanas em si, penso que foram muito baixas. A maneira como me deram o documento foi como se eu fosse descartável. Sei que não sou o maior da rádio, mas sei que tenho um papel e uma carreira. Essa bagagem dá-nos uma espécie de um astro, não é que eu queira ser tratado principescamente, mas queria ser tratado educadamente e foi isso que faltou. Disseram-me que eu tinha uma voz velha para o projecto da Comercial, quando eu era a pessoa que mais música nova passava. Além disso, eu faço voz-off na SIC e na altura anunciava a "Floribella", um produto para crianças.
O que é que o continua a mover?
O gosto pela música e pela rádio, acabando por haver quase um concubinato entre as duas coisas. A vontade de fazer rádio. Ninguém nunca a ouvir um programa da minha autoria vai ter a noção de que daquele lado está uma pessoa chateada a despejar música. É um prazer enorme dar música às pessoas.
Considera-se um baluarte da resistência?
De certa maneira. Boa parte das pessoas que trabalharam na rádio com uma postura semelhante à minha já baixaram todos as guardas ou dedicaram-se a outras coisas, a actividades mais rentáveis ou até mentalmente desligaram. Nem toda a gente tem a paciência, nem a flexibilidade da minha mola para ouvir música nova.
"Viriato 25" é um programa que lhe enche as medidas?
Neste momento, sim. Há ali duas, ou três coisas a fazer. O que falta é mais conteúdo cultural, mais rubrica a nível de coisas contextualizadas. Por um lado, tem havido uma certa hesitação, porque trabalhar entre a 1 hora e as 3 horas da manhã, tinha um véu, uma colocação. Trabalhar entre as 23 horas e a 1 hora, faz toda a diferença em termos de captação de ouvintes. O programa agora não é "late night". No outro, na última meia hora esticava-me e passava coisas, não diria inaudíveis, mas duras de roer. Raciocinei, como quando fiz manhãs, não posso açoitar ninguém àquela hora. Não nos podemos esquecer que a rádio tem uma multifunção e obrigações básicas: formar, informar e divertir.
O que é que ainda não fez em rádio que gostasse de fazer?
O que já não venho a fazer, que é uma das minhas tristezas grandes, que é formar profissionais. O que adorava mais era poder dizer hoje, amanhã, ou depois, este tipo aprendeu comigo e é bom.
Como gostaria de ser lembrado?
Como um bom homem, que fez mais coisas boas do que más. Como um bom pai. Profissionalmente como uma pessoa que entrou para a rádio com vontade de a servir com humildade e não para se servir dela para proveito próprio.
fonte: JN
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