Entrevista a Pedro Boucherie Mendes

Um ano depois de assumir a direcção de Conteúdos dos canais temáticos da estação de Carnaxide, o ex-director da ‘FHM’ faz um balanço dos resultados alcançados pela SIC Radical e SIC Mulher. Renovar a imagem da SIC Radical, com o objectivo de a tornar um canal 'mais cómodo para o espectador' e diversificar as ofertas da SIC Mulher têm sido as prioridades de Pedro Boucherie Mendes.
A SIC Radical sofreu algumas alterações ao longo deste ano. ‘A Vida e a Bela’ e a nova temporada de ‘Vai Tudo Abaixo’ são apenas duas entre muitas novas propostas?
Sim, estamos a preparar outros programas. Nós o que fizemos foi estabilizar a grelha primeiro. Não há nenhum canal que possa funcionar sem estabilizar a grelha. Uma grelha estabilizada significa que há alguma previsibilidade. O espectador sabe o que esperar do canal. E depois tentamos ter picos, momentos imprevistos, dentro dessa previsibilidade. O ‘Vai Tudo Abaixo’ e ‘A Vida e a Bela’ são produção nacional, são grandes apostas da SIC Radical, porque tudo quanto é nacional tem mais impacto junto da opinião pública e dos espectadores, e são os primeiros passos de um processo de renovação da Radical, um arejar do canal, que era um canal forte, mas que no último ano já não o era tanto. Não foi culpa de ninguém, são ciclos.
O aparecimento de novos canais desempenhou um papel nessa queda?
Sim. Os canais de séries entraram no mercado e isso isolou um pouco a Radical. Nós não podemos competir com esses canais, porque não podemos comprar as séries. Fazem parte de um line-up internacional e são exclusivos dos canais, por exemplo o caso do ‘CSI’, exclusivo do AXN. E quem não tem cão, caça com gato. Mas eu acho que quem não tem cão, também pode caçar com leopardo, ou com tigre. E é isso que estamos a tentar fazer com estes programas.

A SIC Radical passou por várias fases, com fortes apostas no wrestling ou no anime, por exemplo. Neste momento, o que se pode esperar do canal? Maior variedade de programação?
É um canal com tudo incluído. Na antena da Radical quase tudo pode acontecer. Incluindo wrestling e anime, que continuamos a ter. Mas outro tipo de programas também. Nós temos boas séries, bons reality shows, como ‘Quem Quer Ser um Super-Herói’. Em mais nenhum canal nacional poderíamos ver este tipo de programa.

Está à frente dos canais temáticos há quase um ano. Os resultados alcançados correspondem às expectativas que tinha no início?
Eu tenho sorte de trabalhar com pessoas de muito valor e a SIC é um tesouro de talentos. As promoções dos novos programas (‘A Vida e a Bela’ e ‘Vai Tudo Abaixo na América’) podiam passar em qualquer canal do Mundo e isto é feito pela SIC. O que eu fiz correspondeu às expectativas, mas posso fazer melhor ainda.

É possível a SIC Radical e a SIC Mulher alcançarem melhores resultados, com a concorrência que têm hoje?
Eu acho que é possível fazer mais e melhor, mas televisão também é muito uma questão de sorte, estar no lugar certo à hora certa. A concorrência é uma coisa boa. Quem me dera que houvesse ainda mais canais, porque a concorrência obriga a pensar. Mas imaginemos que os próximos programas que eu estrear fracassam. Não sei. Temos que ter canais suficientemente fortes para que os espectadores adiram às nossas escolhas. Ou seja, se eu gosto da SIC Radical, logo esta série que os tipos compraram deve ser boa. Mas acho que é possível crescer mais.

Em relação à SIC Mulher, houve grandes alterações?
Não, a SIC Mulher é um canal bem mais estabilizado e com muita concorrência. A maioria do público de televisão generalista é feminino e vão menos ao cabo. Estamos a assistir a um crescimento da produção de telenovelas na TVI, as mulheres também são o público maioritário dos canais de séries, portanto a SIC Mulher tem mais dificuldade, mas está a ter o melhor ano de sempre e teve o melhor resultado de sempre este ano.

E estes resultados deveram-se a quê?
Criar linhas horizontais de programação. Programámos, por exemplo, uma sitcom de segunda a sexta-feira às 21h00, o ‘Will & Grace’. Isto não tem nada que saber. Fazer televisão não é uma ciência oculta. Não havia na oferta televisiva em Portugal uma sitcom e os portugueses gostam de sitcoms.

E têm mais talk shows agora...
Sim, além da Oprah Winfrey temos também a Tyra Banks. São dois talk shows que são a imagem de marca do canal. E tivemos também este ano um grande sucesso com o ‘Project Runway’, um doc-reality show, um género muito em voga nos mercados internacionais neste momento.

Voltando à SIC Radical, uma das grandes apostas do canal, o ‘Vai Tudo Abaixo’: é para continuar depois desta temporada dedicada às presidenciais nos EUA?
É sim, sem dúvida. Mas queria acrescentar uma coisa sobre a SIC Radical. O espectador português é muito mentiroso. Nas conversas que tem comigo diz que adora o ‘Daily Show’ e o ‘Conan O’Brien’, dois dos programas com pior audiência. Se eu fizesse um canal com a grande programação, com o ‘Daily Show’, os espectadores dizem que adoram o programa e a maneira como ele (Jon Stewart) critica a política norte-americana. Adoram, mas não vêem!
DA IMPRENSA PARA A TELEVISÃO
'É PRECISO SABER ENTENDER OS PÚBLICOS'
Tendo em conta que veio da ‘FHM’, como se adaptou a director de Conteúdos de um canal como a SIC Mulher?
É um trabalho como outro qualquer. Se a SIC me pedir para fazer um canal dedicado a pessoas que gostam de pinguins, eu faço.

É apenas uma questão de conhecer os públicos e gerir a programação?
É uma questão de gestão, obviamente. É preciso entender os públicos, saber fazer perguntas e respondê-las. A vida não é assim tão complicada.

SEXO E FUTEBOL
Depois da mudança de imagem da SIC Radical, o público-alvo já não é mesmo?
Não acredito em públicos-alvo em Portugal, é um País demasiado pequeno. Quando dirigia a ‘FHM’ fi-la o mais abrangente possível. Há coisas que tocam as pessoas todas, como o futebol e o sexo. E neste momento, na SIC Radical, tenho ‘O Momento da Verdade’ e a minha empregada passou a ver o canal. É o target? Claro que não, mas vê o canal. Muito importante na SIC Radical é ser um espaço de liberdade e é importante que o espectador se identifique com isso.

Ainda há programas que só podem passar na SIC Radical?
Esperamos que estes programas, apesar de só poderem passar na Radical, não sejam esquisitos a ponto de excluir público. Acreditamos que é possível ter programas diferentes, mas que não são violentos, ou escuros. Podemos ser alternativos com um tipo de televisão cómoda para o espectador, o que a SIC Radical, na minha opinião, não era nos últimos tempos. Nós queremos ter programas diferentes, mas que sejam inclusivos.
PERFIL
ESCOLHAS OUSADAS
Durante a sua carreira esteve ligado sobretudo à imprensa, como subdirector da ‘Maxmen’ e director da ‘FHM’. Na TV integrou o painel de comentadores do programa de debate satírico ‘Prazer dos Diabos’, emitido pela extinta SIC Comédia. Tem 38 anos.

Comentários