"Balsemão nunca interfere"

Conceição Lino, pivô da SIC, volta amanhã à antena com o programa de informação "Nós por cá".
O regresso à SIC do "Nós por cá" - volta hoje à antena - serviu de pretexto para uma conversa com Conceição Lino acerca do jornalismo que se pratica em Portugal, as amarras antigas e as novas, disfarçadas muitas vezes por um intermediário chamado agências de comunicação. Da estação onde trabalha, conta que o seu presidente Francisco Pinto Balsemão se pronuncia sobre algumas notícias depois de saírem, o que não quer dizer, porém, que interfira. A jornalista chama anómala à suspensão do "Jornal Nacional" de sexta(TVI).
O que traz de novo o "Nós por cá"?
Vai trazer um olhar mais atento à actualidade diária. Para isso se juntou à equipa Ana Luísa Galvão. O Luís Costa Ribas vai olhar sobre o que se vai passando fora do país com um espaço regular que se chama, claro, "Eles, por lá". E a Teresa Conceição vai rechear o programa com reportagens que dão sempre gosto ver.
O programa continua a receber muitas sugestões dos cidadãos?
Recebemos à vontade mais de uma centena por dia só de emails.
Tem ideia da quantidade de problemas que foram resolvidos graças à cobertura dada no "Nós por cá"?
Sei que havia programas em que pelo menos duas das situações que abordámos já tinham ou iam ter uma resolução. Mas já que fala nisso, essa vai ser uma vertente do programa a que daremos mais atenção. Muitas vezes, somos demasiado discretos em assumir que só ocorreu esta ou aquela mudança devido à nossa intervenção.
Jornalismo de proximidade ou cívico são designações dadas a este tipo de trabalho. Em que tipo de jornalismo se inscreve?
Não gosto de classificações. O que nós fazemos é jornalismo, ponto. Apenas é um jornalismo que se interessa mais pelas pessoas a um nível mais individual, se quiser.
Há ou não, a seu ver, um desfasamento do jornalismo que hoje se pratica em relação ao que é interesse do cidadão?
O jornalismo é feito em televisões, jornais, rádios; enfim, há muito por onde escolher. No entanto, gostaria que os jornalistas fossem mais além do que relatar. Isso implica um maior envolvimento, que não tenham amarras de espécie nenhuma, que estejam bem informados, que sejam rigorosos e críticos. Ou seja, dá mais trabalho e exige investimento.
Já agora, qual é a sua opinião em relação ao que se passou na TVI? Terá havido atentado à Liberdade de Imprensa?
Parece-me que é uma situação que gostaria de ver totalmente esclarecida. Porque, à partida, a suspensão em cima da hora de um noticiário que estava previsto parece-me anómalo. E depois, só o facto de essa decisão se prestar a essa leitura deveria ter evitado esta decisão em cima do acontecimento. Porque é óbvio que se presta a todo o tipo de leituras e de aproveitamentos.
Como devem ser as relações entre a administração e a direcção?
Devem ser de respeito mútuo mas não de promiscuidade ou confusão de papéis. Uma direcção pode avaliar e discutir conteúdos e o trabalho dos jornalistas mas o papel de uma administração não é esse. Se discorda da direcção, em primeiro lugar pode decidir dispensá-la. Mas uma redacção onde há pressões ou receios é uma redacção fraca.
Seria possível suceder algo do género na SIC? Uma administração interferir na Informação?
Até agora não vi isso acontecer. A administração da SIC é presente no dia a dia da estação, é atenta, mas que eu saiba não manda pôr nem tirar. Além disso, à frente da administração da SIC está um homem que começou a vida profissional como jornalista, foi director de jornal, lutou pela Liberdade de Imprensa, dá valor à liberdade e ao que ela custou a conquistar. Não me parece que o dr. Francisco Balsemão, mesmo por interesses económicos que, obviamente não lhe são indiferentes, sacrificasse essa conquista. Mesmo que haja notícias de que gosta mais e outras de que não gosta e que até não se coíba de dizê-lo.
Quanto às interferências de que é alvo o jornalismo. Serão sobretudo económicas ou políticas?
Ambas. Os diversos poderes têm muitas tentações de interferir. E os jornalistas não devem ter qualquer tipo de complacência para com iniciativas dessa natureza. Mais. Para mim, nem devem sequer cultivar amizades ou proximidades com essas pessoas para que não sintam qualquer espécie de constrangimentos no seu trabalho. Quanto maior distância, melhor.
Qual é o peso que hoje em dia têm as agências de comunicação no jornalismo?
Têm peso a mais. Porque se virmos que representam cada vez mais todo o tipo de interesses isso significa que pretendem ter cada vez mais presença nas agendas dos diversos órgãos de comunicação. Por outro lado, é estimulante para os jornalistas evitarem o engodo das notícias com que essas agências enxameiam as redacções. Mas isso obriga a uma maior preparação e atenção e capacidade crítica.
De que forma a crise económica tem afectado o jornalismo?
Obriga a fazer mais em menos tempo, com menos gente. Mas se baixarmos os braços, é pior.
fonte: site JN

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